sexta-feira, 23 de abril de 2021

1971: UM ANO QUE ABALOU O MUNDO DA MÚSICA PORTUGUESA

 



(Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades- J.M. Branco)

Corria o ano de 1971.

Para além do velho nacional-cançonetismo, ouvia-se, de há anos a esta parte, um novo tipo de música portuguesa, de elevada qualidade, que associava os acordes musicais à poesia de luta e mobilização, inicialmente divulgada junto dos meios académicos, no meio de uma apertada censura e vigilância policial, que nenhuma "primavera" marcelada conseguia disfarçar. 

Do fado de Coimbra foram evoluindo, explorando novas temáticas, musicais e poéticas, acima de todos, José Afonso e Adriano Correia de Oliveira, com Carlos Paredes a criar novos sons na guitarra portuguesa, tal como António Portugal. E, no exílio, lutavam as vozes de Luís Cília e Tino Flores (tão injustamente esquecido...), a que se juntariam José Mário Branco e Sérgio Godinho.

As suas músicas passavam em ambientes "conspirativos", raramente na rádio, e aqui graças a corajosos radialistas como João Paulo Guerra ou Leite de Vasconcelos.

Na TV, nem ver.

Porém, a aproveitando a tal "primavera", Carlos Cruz, Fialho Gouveia e Raul Solnado, com a colaboração de José Nuno Martins, criam o programa "Zip-Zip", que seria, julgo que até à data, a mais extraordinária inovação televisiva de sempre. Nos seus pouco mais de 8 meses de vida, entra-nos o país real portas adentro, acompanhado por vozes até aí praticamente desconhecidas do grande público, mas que por cá sempre andaram, como Adriano, Paredes, José Jorge Letria, José Barata Moura, Francisco Fanhais, Samuel, Pedro Barroso, Manuel Freire, entre outros (menos o Zeca, sempre interditado pela censura). Desse perfume de liberdade ficou-nos a "Pedra Filosofal", de António Gedeão e Manuel Freire, que nos ensinou que "O sonho comanda a vida".


 (Pedra Filosofal - Manuel Freire)

Daí em diante altera-se o panorama  musical, incluindo da parte da indústria fonográfica.

Zeca Afonso e Adriano, essencialmente, já tinham de há muito discos editados, sofrendo sempre a insaciável fúria censória. Como não lembrar "Vampiros" ou "Menino do Bairro Negro" do Zeca, ou esse hino à liberdade e à luta, que é "Trova do Vento que Passa", com versos de Manuel Alegre e música de António Portugal, eternizada pelo Adriano ?

Até 1971, nestes discos, e noutros entretanto editados, quer do Zeca e Adriano quer de outros, os acompanhamentos praticamente eram reduzidos a guitarra, viola, e pouco mais.

Mas 1971 assinala uma ruptura musical que marcaria, de forma indelével, toda a música portuguesa. São editados, para além de "Movimento Perpétuo" de Carlos Paredes, quatro trabalhos que marcam essa ruptura

-DO ADRIANO - "GENTE DE AQUI E DE AGORA".

Neste trabalho, Adriano canta 10 temas todos musicados pelo amigo José Niza, que também assina, com José Calvário e Rui Ressurreição, os arranjos e orquestrações,  sendo a voz acompanhada por uma orquestra dirigida pelo José Calvário. Os poemas são de diversos autores, de Manuel Alegre a António Aleixo, de Raul de Carvalho ao Conde de Monsaraz, dos galegos Curros Henriquez e Rosalia de Castro a Fernando Miguel Bernardes ou a Luís Andrade e António Ferreira Guedes.

Esta corajoso trabalho inovador, inédito, de Adriano foi gravado  nos estúdios Polysom em Lisboa, com chancela da histórica editora Orfeu, de Arnaldo Trindade, e capa de Silva e Castro. 

Para registo, a faixa "Canção Tão Simples", com versos de Manuel Alegre:


 

-DO JOSÉ MÁRIO BRANCO - MUDAM-SE OS TEMPOS, MUDAM-SE AS VONTADES

Falando de ruptura, o que dizer desta obra-prima do Zé Mário? É todo um cromatismo musical, que convoca sons que bebem da balada medievel até à instrumentação electrónica, num todo homogéneo e coerente, da música à palavra, aproveitando as potencialidades dos Strawberry Studios de Michel Magne, em Hérouville, a 60 km de Paris, e dos instrumentistas que o  acompanham, realçando ainda mais o imenso talento do autor e, convém acentuá-lo, do também inspirado arranjador e orquestrador, ´que no futuro tantos intérpretes irá "moldar", sem esquecer, também, a qualidade do técnico de som Gilles Sallé.

José Mário Branco oferece-nos dez extraordinários temas, vindo à memória a inesquecível "Abertura", com os sons da Gare d'Austerlitz (onde desembarcava a emigração...).

Destes temas, Sérgio Godinho contribui com 4 poemas, Zé Mário com 3, e os restante são de Camões, Natália Correia e Alexandre O'Neill.

A edição é da Guilda da Música (Sassetti) e a capa de Armando Alves e José Rodrigues.

Fiquemos então com ONeill e "Perfilados de Medo":




 

-DO SÉRGIO GODINHO - ROMANCE DE UM DIA NA ESTRADA 

Sérgio Godinho, poeta, músico, actor, cantor, incluindo no metro de Paris, andarilho das vidas e das canções, encontra-se aqui com o maetro, arranjador e orquestrador José Mário Branco, que lhe franqueia as portas dos Strawberry Studios.

Neste EP, juntam-se assim o transbordante talento de Sérgio, como uma capacidade especialmente letrista fora do comum, com a técnica, o rigor e a inovação musical. Este trabalho, que seria precursor do primeiro album de Sérgio, "Sobreviventes", de 1972, apresenta 4 canções que viriam a ser incluídas  no futuro album.

Esta obra, que espelha como que um jogral vagabundo, colhendo das estradas e experiências da vida os temas a interpretar, apresenta-nos 4 poemas e 3 músicas do Sérgio, e uma música  do Zé Mário ("O Charlatão"), sendo edição da Guilda da Música com capa de Lopes Alves.

Eis, então, o "Romance....":




-DO ZECA - CANTIGAS DO MAIO

Então, agora o que dizer?

Do José Afonso todos conhecemos a sua genialidade como autor musical e poeta. Desde os tempos do fado de Coimbra, onde corajosamente rompeu com a tradição, explorando novos caminhos estéticos, até aos seus três enormes trabalhos de longa duração: "Cantares do Andarilho" (1968), "Contos Velhos, Rumos Novos" (1969) e "Traz outro Amigo Também" (1970), os dois primeiros com acompanhamento à viola por Rui Pato, o último por Carlos Correia (Boris).

Em 1971 este talento inato cruza-se com José Mário Branco. E com o Strawberry Studios e o técnico de som Gilles Sallé. A  genialidade poética e musical é aqui elevada à máxima e cuidada qualidade, potenciando todas as matizes da canção, poesia e voz do Zeca, com a introdução de sons e instrumentos (guitarra baixo, trompete, flauta, percussões) que só realçam e como que libertam tais qualidades, ressaltando também, e uma vez mais, o grande arranjador e orquestrador que é o Zé Mário. Assinala-se, também, nos coros, a colaboração de Francisco Fanhais. 

"Cantigas do Maio", é este o nome do album, torna-se uma pérola única na música portuguesa, muito justamente considerado o melhor trabalho de sempre.

Temos 10 temas de intenso lirismo, 9 musicados pelo Zeca e um, de raiz popular, trabalhado pelo Zé Mário ("Milho Verde"), e que têm 9 poemas de José Afonso e um de António Quadros (pintor) ("Ronda das Mafarricas"). A edição é da Orfeu, com capa de osé Santa Bárbara

Vale a pena ouvir, uma e outra vez, este verdadeiro património da Cultura Portuguesa, seja na vertente poética, na musical, na orquestração. E na voz! A voz única de José Afonso.

Evoca-se um ícone musical e definitivo desse trabalho, "Coro da Primavera" (poema e música do Zeca), fechando esta pequena evoção do ano de 1971 .



 

 

quinta-feira, 25 de maio de 2017




GRÉCIA : DAS PUTAS E DO VINHO VERDE

Grécia, não sei se foste tu que me abraçaste, se sou eu que te abraço e adopto.
Quanto mais te conheço mais aprecio os versos com que Sophia de Mello Breyner genialmente te mostrou.
Mas sabes Grécia, há quem não pense assim...
Há por aí um Disselcoiso e outros Coisos lá do Norte que, olhando para os teus mais de três mil anos de vida, dizem que passaste o tempo a pedir dinheiro emprestado os tipos para o gastares todo em putas e vinho verde.
Aqui para nós, Grécia, não sei, nem vi, ou então sofro de miopia, se lá nas tuas cidades existem Bairros da Luz Vermelha...fica-me a dúvida. 
Como sabes, bairros desses, de donzelas expostas em vitrinas como coisas fossem, é algo que não existe nas terras dos Coisos.
Nem pensar!
Tal como o vinho verde, que, se existir nos teus mercados, é capaz de ser uma mistela marada exportada por galegos que assaltaram os segredos guardados nas caves de Monção ou Ponte de Lima, logo, põe-te a pau com isso, Grécia.
Como perfeito contraste, bem sabemos, tu e eu, que nas urbes dos Coisos, não há vinho, verde, branco ou tinto, muito menos consumo de alcoois.
Como bem se sabe vendo o comportamento deles, serenos e delicados, quando acompanham as suas equipas de futebol...Perfeitos gentlemen!
Portanto, putas e vinho verde é contigo Grécia, e outros devassos do Sul...
Mas...aqui para nós, talvez não seja bem isso.
Sabes, para mim é pura inveja.
Nos tempos idos em que tu representavas, declamavas ou cantavas no Epidauro, edificavas o Parthenon ou a Acrópole de Micenas, discutias na Agora o destino, o passado, o futuro, os desafios que se colocavam ao Homem, andavam os Coisos hirsutos, sujos, com tanga em pele de urso, a perseguir a pé, armados de paus toscos com pontas de metal mal ajambradas, para perseguir e comer veados e javalis, a sonhar em serem, apenas, uns quaisquer figurantes numa qualquer Guerra dos Tronos, e a viver em buracos cavados nos rochedos.     
Portanto, Grécia, deixa-os lá roerem-se...
E por cada desfeita mesquinha que te façam, ri-te na cara deles e dança.
Dança até não haver amanhã.
Porque quando eles estiverem sob sete palmos de terra, esquecidos, tu continuarás a refulgir nos teus jovens três mil anos e a ser uma inspiração e um exemplo!   


terça-feira, 14 de março de 2017

O CANTO E AS ARMAS

O Canto e as Armas.
Passam 50 anos desde a primeira edição deste livro, em tempos de servidão, em que se subiam, olhando para todos os lados, as escadas que conduziam à Livrelco, ali para os lados de Entrecampos, mais precisamente na Rua José Carlos dos Santos, cooperativa livreira que viria a ser encerrada pela PIDE após o assassínio de Ribeiro dos Santos, entre outras vicissitudes do tempo em que a "Portugalidade" governava....
E ali, na livraria, manuseavam-se, folheavam-se livros que a indigência lapiazulada proibia.
E entre eles, comprou-se este livro de poemas de Manuel Alegre.
Cinquenta anos depois, fitá-lo, folheá-lo, lê-lo, declamá-lo, não é saudosismo, é homenagear um velho amigo, tornado vivo pela mão e o estro poético de Manuel Alegre, que nos abria os horizontes num túnel escuro, que nos alimentava uma esperança nunca abafada, que se transportava em canções que nos tocavam os sentidos e o coração.
E, 50 anos depois, achamo-nos a ler ou a ouvir, e tudo nos parece hoje, palpável, real.
Porque, 50 anos depois, aqui, agora, nesta Europa, neste Mundo, nesta vertigem, é urgente que alguém resista, que alguém diga Não!
(Trova do Vento que Passa - de O Canto e as Armas. Música de António Portugal)

quarta-feira, 8 de março de 2017

8 DE MARÇO

 
8 de Março
Dia Internacional da Mulher.
De todas as Mulheres
De toda a Humanidade.
Não um dia.
Todos os dias.
Lado a lado.
E olhando o Futuro de frente!
 
DIA INTERNACIONAL DA MULHER
      As mulheres ao meu lado
      Trabalham como eu
       As mulheres ao meu lado
       Estão em pé de igualdade comigo
       As mulheres ao meu lado
       Levantam-se mais cedo que eu
       Preparam o pequeno almoço e o almoço das crianças, lavam-nas, levam-nas à escola, e algumas até deixam o pequeno almoço para o companheiro.
        Eu não
        As mulheres ao meu lado
        Saem do trabalho à mesma hora que eu
        Chegam a casa à mesma hora que eu
         Vão buscar as crianças à escola, lavam-nas, vestem-lhes os pijamas, põem a roupa a lavar, preparam o jantar para todos.
          Eu janto e fico a ler, a ver a TV ou a cuscar na Internet.
          As mulheres ao meu lado
           Lavam a louça do jantar, arrumam-na, abrem a máquina de lavar a roupa, estendem-na no arame
            Eu deito-me, chega por hoje
            As mulheres ao meu lado
            Passam a roupa, deitam os filhos, aconchegam-nos e mimam-nos, com o amor de um sorriso límpido e lindo, ao fim de mais um dia igual…na igualdade (?).

            As mulheres ao meu lado
            São-no todos os dias
         Não as prendam num só!                                                                                                                                                                 
    
Luís Diogo – 8/03/2012    
 
 (Bob Dylan - Just Like A Woman)

domingo, 20 de março de 2016

SEM DESCULPA!

(Os "Lobos de 2007, o Haka neozelandês. Havia Rugby!)
 
Sábado, 19 de Março de 2007 .
No estádio universitário de Lisboa a selecção portuguesa de rugby perdeu com a Rússia por 53-21.
Pela primeira vez Portugal desce à divisão 1B do rugby europeu, ou seja, à terceira divisão.
Pela primeira vez Portugal, e quase toda uma geração de jogadores estão incapacitados de disputar o acesso a um Mundial de rugby, o de 2019. Sete longos anos até ao Mundial de 2023. E quanto a esse...
Portugal ocupa, hoje, o 29º. lugar do ranking mundial. Amanhã sairá nova classificação, novo trambolhão. Há 10 anos, só 10 anos, o lugar era o 16º.
E não venham com desculpas esfarrapadas.
Todos assobiam para ar, ninguém assume responsabilidades.
O que fizeram desta modalidade que, graças aos inesquecíveis e enormes "Lobos" de 2007 se popularizou a ponto de os seus praticantes passarem quase para o dobro e se assistir à criação de vários clubes, de norte a sul?
Quem quis elitizar um desporto que, de início até teve a fama de estar confinado a elites?
Quem tem medo do grande público e se rodeia de "tios" e "tias"?
A formação, a escola, a preparação, a captação...onde?
Não há direcções federativas, conselheiros de tudo e nada, magos fazedores de opinião, daquela de que  se quer ouvir sem contraditório?
Para quem a praticou, mesmo que por breves anos, para quem a considera a mais bela, vibtrante e honesta modalidade desportiva, estes dias de chumbo são terríveis, difíceis de ultrapassar.
E para quem a pratica e a ama, desinteressadamente, o peso ainda é maior.
Há dias evoquei Serafim Cordeiro Marques, o grande "Cordeiro do Vale", que, na RTP e no velho CDUL ensinou e fez amar o Rugby a gerações de entusiastas.
Ele, e muitos outros, não merecem esta hora, o Rugby tem de ser regenerado.
Como o não merece um jogador que, naquele triste sábado, andava no meio dos 23 portugueses: Vasco Uva, para sempre o Grande Capitão. 

quarta-feira, 9 de março de 2016

ATÉ QUE ENFIM!

Finalmente, quase 36 anos depois, vemos-te pelas costas.
Depois de, desde sempre, as teres voltado para nós.
Como primeiro-ministro, como o presidente, como pessoa.
Destruíste uma agricultura, uma pesca, uma indústria, apoiaste, por acção directa ou inacção calculada, os que quiseram vergar e ajoelhar este país.
Inclinaste sempre a cerviz perante o estrangeiro, como qualquer provinciano iletrado, que, no fundo, és.
Tens os piores defeitos que se podem encontrar entre os portugueses.
Rancor a quem desafia o pensamento único, a verdade absoluta, os interesses instalados.
Mesquinhez perante o êxito alheio, a alternativa que tem sucesso.
Mediocridade no verbo, na prosa, nos conceitos, na expressão, na "indicação" que, intencionalmente, usaste por contraponto a "indigitação". 
Ignorante para tudo o que cheire a cultura, a arte, a educação.
Nunca leste a "Utopia" de Thomas Mann. Porque Thomas Mann nunca a escreveu.
Não sabes os cantos dos Lusíadas porque também desconheces o que canta o Poema.
Afrontaste, assumidamente, o único Prémio Nobel da Literatura em língua portuguesa.
Mas soubeste penduricalhar quem o censurou.
Entre outros.
Que não são empreendedores, formadores, lideres, fazedores de esperança ou de empregos.
Apenas novos-ricos, chicos-espertos subsidio-dependentes, que infestam e chulam este país, muito à maneira parola e interesseira que gostas de cultivar, e cuja mais-valia é igual a zero.
Por isso  penduricalhas Dias Loureiros ou Zeinais Bavas.
E rodeias-te de Duartes Limas, Oliveiras e Costas, Ricardos Salgados.
E, como qualquer patego-olha-o-balão, falas em vacas açorianas sorridentes, grandes bananas da Madeira ou cagarras apertadas das Selvagens.
E figuras no retrato oficial com a pose pernóstica, caneta em riste para cortar sabe-se lá o que te vai na cabeça, mão pousada sobre livros que desconheces, como vulgar pato-bravo que forra paredes com lombadas de prestígio.
E escolhes um pintor conhecido pelas suas obras eróticas, algumas de conotação gay.
Tu que abominas tudo o que vá contra a tua normalidade papá-mamã, feijão com arroz.
É disto tudo que nos livramos, desta tacanhez castradora, deste clericalismo de província.
Olha, se fosses António Silva (vade retro!, coitado dele) em "O Pátio das Cantigas", bem podias ir para termas no Cartaxo.
Que nós, em coro com o Vasco Santana, dir-te-íamos "E quando lá chegares manda saudades, que aqui não deixas nenhumas".



  

terça-feira, 29 de dezembro de 2015

O ADEUS IRREVOGÁVEL (?)

 
Paulo Portas diz que não se candidatará a presidente do CDS no próximo congresso do partido que também tem as suas iniciais (PP), a sua marca, o seu estilo.
E diz que a decisão é irrevogável, irrevogavelmente. E onde já se ouviu e leu isto?
Paulo Portas é, com Cavaco Silva, o político há mais tempo presente na ribalta, pelo menos desde 1998, para já não falar nos seus juvenis tempos do PSD ou, com carácter mais impressivo, os seus anos como director de "O Independente", em que arrasava o labrego de Boliqueime e dizia detestar a política e os políticos.
Pois...
Nunca escondendo o seu narcisismo, o seu egocentrismo, a imensa demagogia, claro que mudaria constantemente de opinião e de bandeira, traço seu muito característico e, depois, é só nomear os cargos, aí o vemos a Deputado na Assembleia da República, Deputado no Parlamento Europeu, Ministro da Defesa, Ministro dos Negócios Estrangeiros, Vice-Primeiro Ministro, sucessivamente afirmando e juramentando tudo e, de imediato, o seu contrário, como qualquer mentiroso compulsivo.
Raspando o lustre, diz-nos adeus(?) um político banal, se político se pode classificá-lo, quebrando promessas e lealdades, virando casacas e traindo amigos e companheiros, fazendo da política um substantivo detestado. Tal como Cavaco Silva.
Se Maquiavel o conhecesse, teria de reescrever "O Príncipe".
Mas classificar Paulo Portas de maquiavélico é dar-lhe a importância que não tem nem merece.
Talvez pensasse ser um Conselheiro Acácio, não chegando, sequer a um medíocre Conde de Abranhos.
Tripudiou contribuintes, agricultores, combatentes, reformados, feirantes, sempre com palmadinhas nas costas e um sorriso aberto de cinismo.
Tudo quis comprar e tudo vender, de preferência logo de seguida.
Afinal, apenas um obscuro vendedor de banha-da-cobra. 
 
(Sérgio Godinho - "O Charlatão")